Brasília nasceu como o maior experimento de integração entre arte, arquitetura e urbanismo já feito no Brasil. A construção da capital, entre o fim dos anos 1950 e início dos 60, reuniu um grupo de artistas e arquitetos que partilhavam o mesmo ideal modernista. Sob a visão do arquiteto Oscar Niemeyer e do urbanista Lúcio Costa, a arte vira parte da experiência urbana da cidade. Nomes como Athos Bulcão e Alfredo Volpi estiveram, pessoalmente, deixando suas marcas nas monumentais construções de Niemeyer para os futuros brasilienses.
O projeto arquitetônico de Brasília resultou em identidade visual inédita no país — quiçá no mundo. Uma cidade onde o espaço público é também espaço expositivo, uma capital em que a arte não se concentra em museus e dá vida ao modernismo brasileiro ao cotidiano até hoje.
O legado não se limita aos modernos. O acervo de arte pública em Brasília recebeu novas obras de Vik Muniz, ano passado, no Congresso Nacional; e do Estúdio Campana, em setembro deste ano, no Palácio do Itamaraty, reafirmando a capital como o lugar onde arte e espaço são indissociáveis.
Abaixo, confira dez obras para viver a arte na cidade.
1. Estúdio Campana: “Biombo Cerrado” (2025)
Local: Palácio Itamaraty, Brasília
Feito à mão em fios de alumínio, com mais de 200 quilos de material e 500 horas de trabalho, o Biombo Cerrado, do Estúdio Campana, é formado por dois painéis que se entrelaçam em curvas metálicas. A peça, entregue em setembro, evoca o movimento e a vegetação do Cerrado, bioma que molda Brasília, e amplia o diálogo entre arte, design e natureza no acervo do Itamaraty.
2. Painel “Ordem e Desvio”, Betty Bettiol (2025)
Local: área de eventos do B Hotel, SHN, Quadra 5, Bloco J – Asa Norte
Artista e designer radicada em Brasília, Betty Bettiol assina o painel Ordem e Desvio, feito com quase 2 mil ladrilhos pintados à mão. Com 17 metros de largura por 3 de altura, a obra combina geometria e cor inspiradas no cerrado, em ladrilho ecológico produzido na capital. Criado especialmente para o B Hotel, o mural foi inaugurado em maio deste ano.
3. Casa de Chá do Itamaraty (1967, reaberta em 2024)
Local: Palácio Itamaraty, Brasília
Projetada por Oscar Niemeyer sobre o espelho d’água do Itamaraty, a Casa de Chá foi inaugurada em 1967 como pavilhão de recepções diplomáticas. Reaberta em 2024, em parceria com o Senac-DF, o espaço funciona hoje como café-escola, unindo gastronomia, formação e patrimônio modernista. O ambiente preserva o mobiliário original de Sergio Rodrigues, Tenreiro e Zalszupin, e mantém o jardim de Burle Marx, reunindo em um só lugar parte do acervo artístico e arquitetônico que define o conjunto do Itamaraty.
4. Alfredo Volpi: “O sonho de Dom Bosco” (1966)
Local: Palácio Itamaraty
Pintado diretamente na parede do Itamaraty, o painel de 3,5 x 4,5 metros retrata o padroeiro de Brasília, Dom Bosco, o santo que teria previsto o surgimento da capital. Instalado no segundo andar do Itamaraty — onde é possível visitar, mas não fotografar — e restaurado em 2017, a obra também pode ser vista de fora, pelas janelas do prédio.
5. Athos Bulcão: Painel no Interior do Cine Brasília (1960)
Local: Interior da Sala de Projeção do Cine Brasília (Asa Sul, Quadra 106)
Além da fachada em azulejos, Athos Bulcão também assina o interior da sala de projeção. Ele utilizou faixas e losangos em relevo de madeira e gesso nas paredes laterais, criando uma textura que serve tanto como elemento visual quanto acústico.
6. Piscina do B Hotel Brasília, Isay Weinfeld (2018)
Local: SHN, Quadra 5, Bloco J – Asa Norte
Projetado por Isay Weinfeld, o B Hotel é um retrato contemporâneo do modernismo brasiliense: concreto aparente, pilotis, mobiliário brasileiro, madeira, arte e horizonte. Na cobertura, o rooftop abriga a piscina linear que se abre para o Eixo Monumental. Integrada ao projeto de Weinfeld, a piscina funciona como espelho d’água suspenso e uma extensão do horizonte da cidade. O pôr do sol visto dali é parte da obra.
7. Cândido Portinari: “Cena Gaúcha” e “Jangadas do Nordeste” (1939)
Local: Sala Portinari, Palácio Itamaraty
As telas “Cena Gaúcha” e “Jangadas do Nordeste” são dois dos três grandes painéis que Portinari criou para o Pavilhão Brasileiro na Feira Mundial de Nova York de 1939. O terceiro painel, “Noite de São João”, foi adquirido pelo Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), mas foi destruído em um incêndio em 1958.
8. Roberto Burle Marx: Tapeçaria no Salão Negro (1973)
Local: Salão Negro, Congresso Nacional
Tapeçaria monumental de algodão com formas orgânicas e cores fortes que evocam a vegetação do Planalto Central.
9. Vik Muniz: “8 de janeiro de 2023” (2024)
Local: Salão Azul do Senado Federal, Brasília
Inaugurada em fevereiro de 2024, 8 de janeiro de 2023 é uma obra de Vik Muniz realizada em colagem fotográfica a partir de fragmentos reais coletados no Congresso Nacional após a invasão do prédio na data que nomeia a obra — cacos de vidro, cartuchos e pedaços do carpete azul do Salão Verde.
10. Pedro Corrêa de Araújo: “Revoada de Pássaros” (1967–1968)
Local: Sala Dom Pedro I, Palácio Itamaraty
Projetado entre 1967 e 1968 por Pedro Corrêa de Araújo, o lustre Revoada de Pássaros é uma das peças mais emblemáticas do Itamaraty. Esculpido em bronze e prata, com cristais de rocha lapidados em Cristalina (GO), ele pesa cerca de 1,5 tonelada e se sustenta em 110 braços metálicos. A obra ficou conhecida como o “lustre dos bacuraus” — referência às aves noturnas do cerrado.