No início da corrida do ouro, quem mais ganhou dinheiro não foi quem procurava o ouro, foi quem fabricava as pás. Hoje, o equivalente moderno dessas pás são os data centers e os chips que alimentam o cérebro artificial do mundo.
E o Brasil, com sua matriz limpa, seu sol generoso e sua energia relativamente barata, está prestes a se tornar o país mais estratégico dessa nova corrida. A pergunta é: vamos vender energia ou vamos vender inteligência?

O paradoxo de uma era faminta
Quanto mais eficiente fica a tecnologia, mais energia ela consome. O economista inglês William Jevons percebeu isso ainda em 1865, e o paradoxo voltou à tona agora, impulsionado pela inteligência artificial.
Hoje, enquanto um cérebro humano consome apenas 20 watts por hora, o ChatGPT gasta milhares de vezes mais para simular um raciocínio semelhante. A diferença é que o cérebro faz isso com propósito. A máquina, com poder.
A IA é o novo motor do progresso e também sua maior ameaça energética. Ela consome como um país e se multiplica como um vírus.
De acordo com a BloombergNEF, a explosão da IA já está alterando a curva energética global. O parque mundial de data centers cresceu 8,3% só no primeiro semestre de 2025, e os novos centros dedicados à IA podem alcançar centenas de megawatts por unidade, o equivalente ao consumo de uma cidade de 100 mil habitantes.
Mas o que poucos percebem é que a IA pode ser a cura para o próprio sintoma que causa. Usar dados para prever demandas, otimizar matrizes elétricas, resfriar data centers e criar materiais mais inteligentes. A IA pode ser, ao mesmo tempo, o problema e a solução.

O Brasil no centro do mapa
Pela primeira vez em muito tempo, o Brasil está na posição certa da história. Enquanto Estados Unidos e Europa enfrentam crises de matriz e dependência fóssil, o Brasil tem algo que nenhum deles tem em escala: energia limpa, em abundância e em expansão.
Segundo o estudo da BloombergNEF, a demanda total de energia do país crescerá 74% até 2050. A principal força por trás desse salto virá de veículos elétricos (17%), ar-condicionado (13%) e data centers (8%), um triângulo que simboliza a nova era da eletrificação, do conforto e da cognição.
O país pode se tornar o grande hub verde da inteligência global, o lugar onde a IA aprende, pensa e respira com energia renovável. Mas ainda falta um ingrediente invisível: consciência estratégica. Não basta ter o sol. É preciso saber transformá-lo em sistema, infraestrutura e valor global.
A gambiarra brilhante da IA
Durante o Zero Summit 2025, ficou evidente que a IA ainda é uma gambiarra. Ela opera com placas de vídeo criadas para videogames, uma solução improvisada e altamente ineficiente. É como usar um trator para escrever poesia.
Enquanto isso, o nosso cérebro faz mais com menos, processando bilhões de sinapses com uma eficiência energética mil vezes superior à da máquina. E é justamente aí que mora o futuro: aprender com o corpo humano.
Enquanto o Vale do Silício tenta vender ferramentas, a China pesquisa robótica inspirada em organismos biológicos que aprendem a se resfriar e consumir menos energia. A tecnologia, curiosamente, está voltando a ser biológica.
O poder concentrado da infraestrutura invisível
Hoje, dez empresas controlam quase metade da capacidade computacional do planeta. Amazon, Google, Microsoft, Meta e Equinix estão entre os gigantes que somam mais de 25 gigawatts de poder energético digital. E essa concentração cresce a cada ano.
No mapa invisível do poder, a energia virou o novo território da soberania. Quem domina a computação, domina o futuro.
O letramento como novo luxo
No meio da euforia tecnológica, há um vazio silencioso: a falta de letramento em IA. Usamos ferramentas poderosas como se fossem brinquedos. Conversamos com a máquina, mas não a instruímos.
Cada “bom dia” enviado a um chatbot acende sete lâmpadas em algum data center do outro lado do planeta. O futuro exigirá um novo tipo de sofisticação — não de status, mas de consciência.
Empresas e pessoas serão avaliadas não pelo quanto produzem, mas pelo quanto de energia desperdiçam para produzir. A elegância do futuro não estará em ter mais poder computacional, mas em usar menos energia para pensar melhor.
Brasil: o cérebro verde do mundo
Se o século XX foi movido a petróleo, o XXI será movido a dados e energia limpa. E o país que equilibrar ambos dominará o novo mapa do poder.
O Brasil tem a chance de ser mais que fornecedor: de ser a mente que energiza o mundo. Mas, para isso, precisa de algo mais raro que o lítio, o silício ou o hidrogênio verde. Precisa de letramento, liderança e visão.
Porque o futuro não vai pertencer a quem apenas consome energia. Vai pertencer a quem souber transformá-la em consciência.
